sexta-feira, 23 de abril de 2010

O vampiro à luz da ciência

As explicações racionais para o vampirismo começaram a surgir a partir da década de 1730. Mentes iluminadas analisaram as informações médicas dos séculos 14 e 15 para demonstrar que as mortes em série atribuídas a vampiros eram, na verdade, fruto de epidemias. Tratava-se de casos de cólera – daí os rostos rubicundos dos vampiros –, ou da peste. A ausência de decomposição de certos cadáveres exumados justificava-se pela natureza seca do lugar do sepultamento.

Em 1742, um pequeno tratado do médico parisiense Jacques Bénigne Vinslow sugeriu que os indivíduos encontrados nus nos caixões haviam sido, na verdade, enterrados vivos e, em desespero, devoraram as próprias mãos e mortalhas. Na maior parte das vezes, vítimas de catalepsia – estado patológico que provoca imobilidade total e costumava levar a diagnósticos falsos de morte.

Até mesmo a ereção do pênis defunto tinha explicação. O erudito Michael Ranft, no século 18, afirmava: “O pênis, de natureza esponjosa, pode erguer-se espontaneamente se um líquido ou sopro penetrar na artéria hipogástrica”.

Em 1997, o químico Wayne Tikkanen, da Universidade da Califórnia em Los Angeles, propôs que o vampiro seria um doente acometido de porfiria, doença hereditária que provoca retração dos lábios e malformação dentária, necrose dos dedos e do nariz e escurecimento da pele, que se torna muito sensível aos raios ultravioleta. Tikkanen diz que muitos doentes se escondiam em caixões para se proteger do sol. Já o neurologista espanhol Juan Gómez-Alonso constatou, em 1998, semelhanças entre os vampiros e as pessoas acometidas de raiva: têm insônia e perambulam à noite, são agitadas e sensíveis à água. Algumas apresentam contrações da face, da laringe e da faringe, que provocam a emissão de sons roucos, e até de uma espuma sanguinolenta na comissura dos lábios, pois a saliva não pode mais ser engolida. Essas teorias, deve-se dizer, não são consenso na comunidade científica.

Do ponto de vista sociológico, o vampiro também foi explicado. Em 1997, os estudiosos Gábor Klaniczay e Karin Lambrecht fizeram uma descoberta curiosa: a explosão de casos de vampirismo coincidiu com o fim da caça às bruxas e tomou o seu lugar, numa necessidade do povo de exorcizar seus demônios e de explicar os males que os atingiam.

Nada disso, porém, desfez o fascínio da criatura sanguinária. Como justificá-la? Por que tantas lendas sobre um bebedor de sangue? “O mito do vampiro nasce do nosso medo da morte e do desconhecido. Era preciso criar o horror, aquilo que perturba um sistema ou uma ordem”, diz a psicanalista búlgaro-francesa Julia Kristeva. O psiquiatra e antropólogo carioca Eugênio Flacksman vai além: “A crendice popular é reflexo do psiquismo humano”, afirma. “O vampiro personificava a inveja, o desamparo psicológico. O invejoso suga a nossa vida”.

Eugênio afirma que, simbolicamente, o sangue pode significar vida – é assim na medicina chinesa e no Antigo Testamento, por exemplo. “Por isso não é de todo despropositado o uso de termos como ‘vampiro emocional’, que anda tão em voga hoje em dia”, diz. Servindo de bode expiatório às culpas, temores e desejos ocultos de pacíficos aldeões, o vampiro, num processo de projeção, as encarnou, acalmando a consciência coletiva. Em pleno século 21, foi-nos reservada a descoberta final: na verdade, todos somos vampiros.

Um comentário:

  1. Deveriam mudar de foto, uma vez que o filme onde entra essa personagem, seja demasiado barbaro!!
    Se nao acreditarem, basta verem: "Underworld - Rise of Lycans" e poderam comprovar o que vos digo.

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